sexta-feira, 29 de agosto de 2008

depois de me ouvir por horas, ele voltou pra casa

ESTIVE MORTO. ESTIVE NO BANCO. O DIA DOS ESTIVES. PAPO DE BAR.

Depois que o bêbado de ontem falou mal da esposa, do william bonner, depois que o cara assistiu e comentou o horário político, a novela e pouco antes de começar o Grenal, enquanto eu tirava as moscas e os siriris da vitrine de risóles, da lâmpada exterminadora e depois de guardar as salsichas de ontem pra amanhã, resolvi eu mesmo contar meus traumas.
Quando criança adorava ler dicionários. Achava que se alguém me flagrasse em tal atividade, iria me achar uma criança fu-di-da. Mas isso nunca aconteceu. Depois, molecote, me encantei com o mundo novo dos computadores. Meu irmão foi o primeiroeúnico a ganhar do meu pai o incrível TK85, todo pretinho, teclas de borracha, uhuhhh... Mas como o brother não me deixava encostar o dedo naquela merda, e sabendo que um amigo do colégio estava vendendo um Commodore VIC20, convenci meu pai a comprar a máquina. Feito o negócio, descobri que o dono seria ninguém menos que, outra vez, o meu irmão. Esses gadgets não tinham nem monitor, eram ligados na TV mesmo e como a gente não tinha duas tvs no quarto, o TK foi aposentado e eu fiquei mais uma vez só na vontade. Quase adulto ganhei uma máquina só pra mim. Não era propriamente minha, era da agência onde eu comecei como redator estagiário. Um macintosh classic. Tesão, só tinha o word, pra mim bastava (e bastaria até hoje). Como todo publicitário besta passei a amar aquela maçã, paixão que terminou logo porque nunca entrei nessa onda tec. Mas só se falava em apple, microsoft, mac, pc... e os nerds donos delas, o Estive e o Biu, ficaram bilionários, bonitos, assunto obrigatório em qualquer roda. Ídolos absolutos da minha geração. Então fui efetivado e com meu primeiro salário, 800 reais, ao invés de comprar um computer só pra mim, resolvi brincar na bolsa de valores. Passei a acompanhar esse mercado diariamente, basicamente para entender porque só eu perdia quando todos ganhavam.
Com a chegada das tvs a cabo substituí aquela mania do dicionário pela leitura das tarjas do blumberg. Achava que se alguém soubesse que eu adorava aquele canal, esse alguém me acharia fu-di-do. Ou quem sabe eu tivesse um brilho repentino, uma informação privilegiada, se de repente eu entendesse algo estranho e codificado nas entrelinhas... investiria um troco e ganharia na loto. Mas isso não aconteceu, como também ninguém nunca me admirou por tal gosto. E até hoje, enquanto o brasil trabalha ou assiste novela, eu acompanho quem sobe, quem desce e quem como eu continua na turma dos "não faz marola".
Só que ontem, ao invés das siglas malucas, o que rodava era o obituário do Estive. O cara da apple morreu.

Não nego que só pensei em quanto as ações da Apple despencariam com a notícia. Quantos morreriam junto com ele depois da grana fácil dos últimos anos. E se alguém tivesse vendido as ações na véspera, o médico particular do Estive talvez, imagina o lucro do filha da puta.
E de repente, o Estive morto por alguns minutos, voltou à terra. Stevevivotempotodo, morreu porranenhuma. E talvez ainda processe o canal e ganhe mais algum. Bilhão. Dedólar.

- dinheiro é foda... comentou o bêbado.

Foda? Foda não é o dinheiro e sim o dono dele. Foda é banco, meu amigo. Banco. Banco bom é aquele que tem em toda esquina, certo? Porranenhuma. Meu banco tem em toda esquina e é uma merda. Tem conta em banco? Então teu banco é uma merda. E o outro Estive, viu essa? Um tal de Estive Jetleye, o banco dele deve ser um aglomerado fresco de todos os cocôs do mundo. Senão o cara não poria a senha da sua conta como lloydsashit (entendeu? "Lloyds é uma merda"). Então de repente sua senha parou de dar acesso e ao contatar o prestativo gerente do Lloyds, descobriu que a senha havia sido trocada por noitsnot ("não é não"). Então ele tentou escondidinho cadastrar pela internet lloydsagarbage ("Lloyds é um lixo"). Mas a senha noitsnot persistia. Reclamou seus direitos mas não foi atendido. Sabe por que? Porque não tinha um puto naquela conta. Desempregado. Era um Estive sem Job. Pobre de tudo, como eu e como você.
- Eu você não come não.

Ah, vai se foder. E quer saber mais? Fechou o bar, amigão. Chega por hoje que eu tenho de ir rápido pro velório do dono do meu banco*. Todo mundo agora dizendo que o cara era o máximo, político bom, empresário, vozeirão e o cacete, mas vão torrar o cara rapidinho. De que adianta ter um belo job se não for Estive? Esse aí não volta mais.